Adeney F. Bueno, pesquisador da Embrapa Soja
Weidson P. Sutil, doutorando em entomologia na Universidade Federal do Paraná
As últimas safras de soja, em especial a safra 2023/24, foram marcadas por relatos de injúrias nas vagens que estavam concentradas nos grãos (Figura 1). Essa injúria foi inicialmente atribuída ao ataque de grilos e combatida com aplicações de inseticidas.
Figura 1. Vagens de soja danificadas pelo ataque de ratos. Foto: Adeney F. Bueno.
Analisando mais detalhadamente as lavouras com relatos de ocorrência desse ataque, observou-se, em algumas dessas áreas, a presença de vagens amontadas (Figura 2), o que é uma característica típica do comportamento alimentar de roedores.
Figura 2. Vagens de soja amontoadas nas lavouras por roedores. Foto: Vithor Chavez.
Diante disso, foi questionado se os grilos poderiam não ser os verdadeiros culpados e, então, armadilhas foram instaladas nas áreas com sintomas de ataques na fazenda experimental da Embrapa Soja em Londrina, PR. Na primeira noite em que as armadilhas estavam instadas, já foi possível capturar ratos (Figura 3). Essas armadilhas com ratos foram mantidas por mais uma noite na lavoura e alguns ramos com vagens de soja, sem qualquer injúria, colocados em seu interior. Na noite posterior, o mesmo sintoma de vagens danificadas foi observado nas vagens que ficaram dentro das gaiolas com a presença dos ratos, confirmando a suspeita de consumo de soja pelos roedores (Figura 4).
Figura 3. Rato capturado em armadilha ‘Tomahawk’ em lavouras de soja de Londrina, PR. Foto: Adeney F. Bueno.
Figura 4. Vagens danificadas de soja por ratos após uma noite dentro das armadilhas. Foto: Adeney F. Bueno.
No mesmo dia da instalação das armadilhas ‘Tomahawk’ na lavoura, foi também instalada em uma lavoura vizinha, uma gaiola (Figura 5A). Dentro dessa gaiola foram colocados uma grande quantidade de grilos (43 grilos) capturados na fazenda experimental da Embrapa Soja. Mesmo após uma semana depois da infestação, apesar dos grilos continuarem vivos e presentes dentro das gaiolas (Figura 5B), nenhum sintoma de dano foi observado nas vagens no interior dessas gaiolas (Figura 5C).
Figura 5. Gaiola usada para o confinamento de grilos com a soja por sete dias (A). Presença dos grilos dentro da gaiola após sete dias de confinamento (B). Ausência de danos nas vagens após sete dias de confinamento de grilos dentro da gaiola (C). Fotos: Adeney F. Bueno.
Essas observações ilustram a importância crucial do diagnóstico preciso para o sucesso do manejo integrado de pragas (MIP). Mesmo o melhor e mais caro inseticida vai fracassar se usado contra o alvo errado. Como agrônomos, somos frequentemente treinados para combater insetos-pragas nas lavouras. Entretanto, precisamos ter uma visão ampla da paisagem agrícola e sempre analisar em diferentes perspectivas os problemas encontrados em campo. O diagnóstico precipitado e equivocado de ocorrência de ataque de grilos, certamente, levou a aplicações desnecessárias de inseticidas, que ao contrário de proteger a lavoura provavelmente apenas aumentou o custo de produção. Além disso, o aumento desnecessário do uso de inseticidas na área pode eliminar insetos benéficos (predadores e parasitoides) causando maiores desequilíbrios nas lavouras e, portanto, deixando-as mais suscetíveis ao aumento de pragas.
Ao contrário de controlar pragas, aplicações erradas e desnecessárias de inseticidas acabam por fazer com que o ataque de pragas aumente! O manejo integrado de pragas de soja (MIP-Soja) recomenda estratégias para o uso correto de inseticidas, trazendo reduções de até 50% do uso de produtos químicos tradicionais em comparação com áreas onde o MIP-Soja não é adotado. Esse uso racional e correto de inseticidas auxilia na preservação do controle biológico natural. Para que esse uso racional de inseticidas possa ser mantido, garantindo uma produção de soja sustentável, associando-se a boa produção com o menor uso de químicos e o menor custo de produção, é preciso que o diagnóstico dos problemas fitossanitários em campo seja feito de forma correta e o controle somente adotado quando realmente necessário. Além disso, é claro, é também essencial que o controle seja adotado contra a praga alvo correta e bem identificada. Só assim é possível ter sucesso no manejo de pragas com a adoção do MIP-Soja.
Fonte: https://blogs.canalrural.com.br/embrapasoja