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O que devemos esperar para a safra de soja em Mato Grosso?

Edison Ulisses Ramos Junior, pesquisador da Embrapa Soja e Ciro Augusto de Souza Magalhães e Dulândula Silva Miguel Wruck, pesquisadores da Embrapa Agrossilvipastoril

O Mato Grosso é o maior estado produtor de soja do país e estima-se que, para a próxima safra, segundo o IMEA, cultive uma área de aproximadamente 12,2 milhões de hectares, com um acréscimo de 0,8% em relação à safra anterior. Apesar do aumento, esse incremento é menor que a média de aumentos que vinha ocorrendo nos últimos anos. Além disso, em virtude das incertezas de mercado e da desvalorização do grão e de seus subprodutos que vem desestimulando o produtor a investir, estima-se que a produtividade média da safra 2023/2024 será menor em 3,3%, em comparação com a safra anterior, que foi em torno de 59,7 sc/ha, ou seja, a projeção para a próxima safra será de aproximadamente 43,7 milhões de toneladas. Com esse cenário desfavorável, tanto a aquisição de insumos tem sido retardada quanto a comercialização do produto, visando melhores oportunidades de mercado, impactando toda a cadeia produtiva.
Além de tais incertezas, ainda há perspectivas de alterações no clima no início da safra, podendo tornar as chuvas mais irregulares nos meses de setembro, outubro e novembro, em função do “El Niño”, principalmente no norte de MT, o que pode comprometer a emergência das plântulas em algumas regiões, pela falta de umidade no solo, comprometendo o potencial produtivo. Espera-se, porém, que essa influência do aquecimento das águas do Oceano Pacífico (Figura 1) seja amenizada no decorrer da safra, podendo ser normalizado nos meses de dezembro e janeiro.


Figura 1. Impactos comuns do “El Niño” no Brasil (Arte: Climatempo)

O enfrentamento a seca que ameaça o sucesso da safra 2023/2024, porém, precisa ocorrer antes da semeadura, com adoção de tecnologias pautadas em ciência. É importante ressaltar que a seca é um problema complexo não exclusivo ao estado do Mato Grosso, de ampla abrangência territorial, com longo histórico de severos danos causados à sojicultura nacional. Diante desse cenário, a Embrapa Soja munida de sua experiência de mais de 40 anos e visão holística, tem buscado ampliar ações de pesquisa e desenvolvimento (P&D) e de transferência de tecnologia (TT) para mitigar prejuízos decorrentes da seca em sistemas de produção de soja em diversas regiões do Brasil lançou o “Programa de tecnologias para enfrentamento da seca na soja – TESS” que constitui em um conjunto de tecnologias e ações para mitigar esse problema tão sério da escassez de água. Mais detalhes do programa podem ser acessados no link.

Outra questão que vem sendo debatida é a da alteração das regras para semeadura de soja em MT que, apesar da previsão de clima atípico, foi adiantada para primeiro de setembro neste ano pelo MAPA (Ministério da Agricultura e Pecuária), com a publicação da Portaria nº840. Solicitada pela AMPA (Associação Mato-grossense dos Produtores de Algodão) para que a “janela” de semeadura de algodão seja favorecida, abrangerá todos os demais produtores. Já o INDEA (Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso) publicou instrução normativa (IN) nº1/2023 sobre o calendário de semeadura da soja que, para esse ano, será de 16 de setembro a 24 de dezembro. De qualquer forma, é de suma importância que se tenha cautela na fase de semeadura mesmo após o dia 15 de setembro pois, o mais importante são os níveis mínimos de água no solo para uma boa germinação e emergência de plântulas, que são bases para o sucesso do empreendimento, trazendo melhores condições para o estabelecimento inicial da lavoura e que se refletirá durante todo o ciclo da cultura. A definição dessas datas tem também impacto direto no risco de disseminação da Ferrugem-Asiática, principal doença que afeta a cultura na atualidade. Mais detalhes sobre a importância do calendário de plantio e vazio sanitário podem ser obtidos na Nota Técnica elaborada pela Embrapa no link.

Outros fatores também devem ser levados em consideração, como o valor dos fertilizantes, por exemplo, que também sofreram redução de preços, inclusive com melhor relação de troca, quando comparado com as últimas safras, o que pode amenizar um pouco as perdas com a desvalorização do grão e favorecer a comercialização. A previsão climática também poderá favorecer, como já ocorrido em outras safras, sendo que após gerar um cenário desafiador inicial, passada a fase mais crítica, poderá trazer períodos com maior luminosidade, favorecendo o desenvolvimento da cultura e permitindo maior enchimento de grãos, com ganhos em produtividade.

Em um momento como este de incertezas, principalmente, mas como em todos os outros, a utilização do manejo correto tanto do solo quanto da cultura é fundamental. Dentre as contribuições que a Embrapa desenvolveu para a cultura da soja em Mato Grosso, podemos destacar a coinoculação da soja. A inoculação de soja, técnica já consagrada, é utilizada há décadas, substituindo a utilização de adubos nitrogenados, com redução de custo e menor risco de poluição do meio ambiente. Além desta, nos últimos anos, a Embrapa desenvolveu tecnologias para um novo grupo de microrganismos do gênero Azospirillum, que promovem o crescimento das plantas por meio de vários processos, como produção de hormônios, indução de resistência sistêmica a doenças e estresses ambientais, a capacidade de solubilizar fosfato e também, de realizar a FBN (Fixação Biológica de Nitrogênio). Esse novo inoculante, utilizado juntamente com o consagrado Bradyrhizobium, técnica conhecida como coinoculação, promove incrementos de 4 a 8% em relação às áreas só inoculadas, tudo isso com baixo custo e ambientalmente correto. Além dessas vantagens, pelo maior desenvolvimento das raízes que proporciona (Figura 2), é uma técnica que favorece a cultura em períodos de maior estresse, como veranicos, sendo uma garantia a mais para o agricultor. Para informações mais detalhadas, acesse aqui.

 


Figura 2. Comparação do desenvolvimento inicial de raízes de soja inoculada com Bradyrhizobium e coinoculada com Bradyrhizobium e Azospirillum.

Outra ferramenta que vem sendo utilizada e ampliada é a utilização de microrganismos solubilizadores de fósforo (Figura 3). Este nutriente interage com as partículas do solo e fica em grande parte retido no solo, sem uso pelas plantas. Com o uso do Biomaphos®, os microrganismos selecionados solubilizam parte desse fósforo, favorecendo a absorção pelas plantas. Segundo Oliveira-Paiva et al., 2020, os ganhos para a cultura da soja foram, em média, em experimentos desenvolvidos em 8 Estados, superiores a 4 sacas por hectare para a soja e, para o milho segunda safra, de aproximadamente 12 sacas por hectare. Além do ganho produtivo e das demais vantagens apresentadas, é uma tecnologia que não agride o meio ambiente e é de baixo custo. Informações mais detalhadas podem ser visualizadas no link.

 

Figura 3. Comparação das plantas com inoculante e sem inoculante de microrganismos solubilizadores de fósforo (P).

A Embrapa Agrossilvipastoril, em Mato Grosso, tem também desenvolvido, juntamente com outras instituições e universidades, alternativas viáveis de uso de plantas de cobertura na entressafra visando melhorias no solo, com maior diversidade de espécies, promovendo ao mesmo tempo um ambiente edáfico mais propício ao desenvolvimento da cultura da soja, e também mais adequado ao ambiente, auxiliando na busca pela sustentabilidade da produção de soja. Dentre as opções avaliadas na segunda safra estão o milho consorciado com a braquiária ruziziensis, consórcios de braquiária ruziziensis com crotalária, os sorgos granífero (BRS 373) e forrageiro (BRS Ponta Negra) e sorgo biomassa (BRS 716), solteiros ou consorciados com estilosantes BRS Bela, dentre outros, que têm apresentado bons resultados. Confira mais detalhes aqui.

Outros dois problemas que vem preocupando os produtores mato-grossenses são a quebra de hastes e a podridão das vagens, popularmente conhecida como “anomalia da soja”. Nesse sentido, a Embrapa tem liderado pesquisas em diversas frentes de estudo, juntamente com instituições, cooperativas e empresas de consultoria com a finalidade de buscar alternativas para identificar os agentes causais, na tentativa de sanar o problema. Alguns dos resultados dos trabalhos realizados na última safra já podem ser acessados no link.

Quanto às cultivares de soja pode-se destacar a BRSMG 534, cultivar convencional, superprecoce, com altíssimo potencial produtivo e alta estabilidade, sendo provida de genes que conferem resistência a ferrugem asiática da soja, tecnologia Shield®. Esta cultivar vem ganhando espaço no mercado, principalmente para os produtores que rotacionam a soja com algodão, ou que desejam fazer a segunda safra de milho em uma janela mais adequada. A BRS 7781 é outra cultivar convencional de porte ereto, precoce, indeterminada, resistente ao nematoide de galha “Javanica” que vem apresentando ótimos resultados em MT.

Em relação às transgênicas, temos o lançamento da BRS774 RR, cultivar com alto potencial produtivo, porte ereto e com boas perspectivas de ganhar mercado e, por ser isenta de royalties por essa tecnologia, pode baratear o custo de produção. Já as cultivares da tecnologia Intacta, duas estão sendo lançadas para a região, sendo a BRS1061 IPRO  e a BRS 7881 IPRO, ambas com potencial produtivo e estabilidade, sendo mais produtivas, pelos resultados dos testes de VCU, que as cultivares padrões da região, sendo boas opções para o produtor.

Pode-se concluir, portanto, que a esta safra será tão ou mais desafiadora para os produtores rurais brasileiros, já acostumados com os percalços cotidianos, porém, se forem tomadas as precauções necessárias e adotadas as boas práticas preconizadas pela pesquisa, temos certeza de que os riscos serão bem minimizados e com grande probabilidade de sucesso.

 

Fonte: https://blogs.canalrural.com.br/embrapasoja

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