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Fazenda do Paraná é exemplo de boas práticas em sustentabilidade

Rio do Pedro, em Santa Maria do Oeste, foi a vencedora da última edição do prêmio Fazenda Sustentável.

Ao som de um sertanejo de raiz, cantado por João Mineiro e Marciano, botas de cano alto, roupas justas, chapéu de caubói, maquiada, unhas feitas e perfumada, Tábata Stock, de 29 anos, chega para trabalhar em sua caminhonete invocada, com pneus esportivos, adesivos na lataria e vidros escuros. Ela recebe – e surpreende – a equipe de Globo Rural, que esperava encontrar Ernesto Stock, proprietário da Fazenda Rio do Pedro, localizada em Santa Maria do Oeste, no centro-sul do Paraná, região com forte presença de imigrantes e descendentes alemães.

FazendaSustentavel (Foto:  )

Ernesto é o pai da moça. Discreto, preferiu deixar com a primogênita a missão de apresentar os trabalhos que ela mesma domina e gerencia diariamente. De fala sempre firme e sotaque paranaense, Tábata fez uma revolução – estrutural, humana e ambiental – nos negócios da família. Aliás, negócios não. “Nossas fazendas não são negócios, são amor”, corrige ela, envolta em uma mesa farta de café da manhã, onde a conversa começa. Orgulhosa, ela logo ressalta a origem das propriedades que administra ao lado do pai.

O cultivo da terra começou na família Stock pelo avô de Tábata, Henrique, já falecido. Ele foi um dos primeiros a chegar a Entre Rios, um distrito de Guarapuava, a 250 quilômetros de Curitiba, fugindo da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Só conseguiu se fixar definitivamente no Paraná em 1951. O cultivo começou no segundo ano após o desembarque no Estado. “Quando eu olho isso aqui, vejo o suor do meu avô e do meu pai. Nossas fazendas nunca estarão à venda”, diz a neta do alemão, que enfatiza algumas palavras batendo as mãos sobre a mesa.

Com a disciplina e a determinação típicas do sangue germânico – mas com um lado bem-humorado que não economiza altas e boas gargalhadas –, Tábata assumiu a gestão das fazendas há quatro anos. Mas a Rio do Pedro, de 1.385 hectares de área total, tem algumas peculiaridades. Encostada no asfalto, possui 810 hectares de área produtiva e 575 hectares preservados. São 590 hectares dedicados a grãos, 165 hectares de pastos, 55 hectares para florestas de pínus e o restante é tudo área de preservação permanente, reserva, florestas nativas e de interesse ecológico não agricultáveis.

Todos os cantos da fazenda são impecáveis. Na oficina, é possível encontrar uma peça de máquina em poucos minutos. As ferramentas são organizadas por tamanho num grande painel. O depósito para guardar defensivos, com canaletas de segurança em caso de vazamento, só pode ser acessado por poucos funcionários, treinados para manusear os produtos. Ao lado, um espaço com chuveiro de segurança e lava-olhos, para eventual emergência. A água usada vem de poço artesiano. A água residual do lavador de máquinas é separada do óleo e tratada para ser reaproveitada.

O capricho se estende às lavouras da fazenda, onde há integração de três atividades – agricultura, pecuária e floresta. Num sistema de rotação de culturas em que nunca se repete um cultivo na mesma área (num ano vai soja, no outro milho), a safra de verão da São Pedro é farta. No último ano, o rendimento médio da soja foi de 4.480 quilos por hectare, 75% acima da média nacional (3.362 quilos por hectare). Com a produção de milho não é diferente: a fazenda colheu 12.380 quilos por hectare, mais que o dobro dos 5.561 quilos por hectare colhidos, em média, no país.

O resultado se deve ao cuidado com a terra. O adubo para as duas lavouras de verão é cultivado no inverno. Como a região é muito fria, a família Stock planta aveia, uma cultura que gosta de frio e serve de alimento para o gado no inverno. “A pecuária não é o que dá mais dinheiro. Entramos com o gado justamente para aproveitar a área no inverno”, explica Tábata. Já as florestas de pínus serão colhidas na próxima década (enquanto isso, servem de sombra para o descanso do rebanho).

As mudanças na Rio do Pedro ocorreram quando Tábata assumiu a direção da fazenda. Enquanto Ernesto, que é agrônomo, toma as decisões técnicas de campo – início do plantio e da colheita, escolha das sementes e adubos, a melhor hora para vender a produção –, a filha cuida da parte "chata". Ela é responsável pela qualidade, gestão de pessoal e sustentabilidade da produção. Tarefas que, para serem cumpridas, custaram alguns sacrifícios. Ela mesma quase desistiu no início da empreitada.

Num setor conservador e predominantemente masculino – de cada dez pessoas em funções de decisão nos empreendimentos rurais brasileiros, somente uma era mulher na época em que a jovem começou a comandar a fazenda, segundo pesquisa da ABMRA (Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio) –, Tábata precisou ter muito jogo de cintura e estômago para enfrentar o machismo, vencer preconceitos e implantar uma maneira totalmente diferente de trabalhar nas propriedades.

A formação acadêmica de Tábata nunca foi tão providencial. Ela é pedagoga e, quando decidiu vestir a camisa da fazenda, estava no fim da faculdade. A resistência dos funcionários em incorporar hábitos totalmente diferentes dos praticados à época foi o maior desafio, conta. “Todos estavam acostumados a lidar com meu avô, depois meu pai. De repente, chego eu, jovem, mulher, impondo metas e novos objetivos. Alguns nem me olhavam nos olhos”, diz.

Para conquistar a confiança da equipe, ela precisou de tempo e esforço. O pai ajudou, convocando uma reunião com todos e dividindo oficialmente a gestão com a filha, que ganhou autoridade e se aproximou de todos os funcionários. Era a primeira a chegar e a última a sair da fazenda.

A mudança radical veio quando Tábata colocou como alvo uma certificação rural internacional, chamada 5S, um conjunto sequencial de práticas desenvolvido no Japão e que tem como objetivo incorporar mudanças comportamentais em todos os setores de uma empresa.

Os cinco "s" são: seiri (organização e melhor uso da área); seiton (simplificação, ordem e arrumação); seiso (limpeza); seiktsu (padronização); e sheitsuki (disciplina e autodisciplina). Hoje, a Rio do Pedro tem essa e outras certificações, que valorizam o preço de venda da produção.

“Quando vou à fazenda e vejo todos alinhados, usando equipamentos de segurança, unhas cortadas, barba feita, impecáveis, fico até emocionada”, diz, recordando-se do início conturbado. “Quando todos trabalham melhor, a equipe funciona mais e traz mais lucro. Não custa nada se colocar no lugar do outro.” O pai de Tábata estava certo quando decidiu ingressar a filha nas propriedades. Era de alguém de humanas que as fazendas precisavam. Mais: do olhar e toque de uma mulher.

FazendaSustentavel (Foto:  )

Fonte: https://revistagloborural.globo.com/Noticias/Sustentabilidade/noticia/2018/02/fazenda-do-parana-e-exemplo-de-boas-praticas-em-sustentabilidade.html

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